segunda-feira, 5 de março de 2012

"A Vida é Bela" (1997). Uma Análise.

Uma mistura de comédia com drama. Um retrato de um grande amor em plena segunda guerra mundial.

Por Matteus Saldanha. (05/03/2012).

Eu devia ter uns 10 anos de idade, e assim como qualquer criança , era chorão e chato.
Minha prima e madrinha Vanessa estava lá em casa com a tia Zenóbia e o tio Adão, e quando eles iam lá seguidamente eu voltava junto com eles e ficava uma noite na casa deles.
Me lembro como se fosse hoje, meu tio estacionando seu Opala na frente da minha casa e eu indo recebê-los naquela alegria de criança quando alguém vai visitá-los tirando a monotonia da casa...Ainda mais a Vanessa que é minha dinda, e a tia Zenóbia que sempre levava algum presentinho (ou alguma torta de bolachinha que só ela sabia fazer).
A Vanessa (E hoje eu não entendo como ela tinha tanta paciência comigo, visto que ela já devia ter uns 17 anos), me falou que havia alugado uns filmes e que iria assistir e perguntou se eu não queria ir junto...Eu, óbvio, vendo a oportunidade de sair de casa aceitei. Minha mãe rejeitou e eu como sempre fui muito chato relutei até que me levaram.
Chegando lá ela escolheu (o VHS na época) do filme a vida é bela, e me perguntou se eu sabia ler rápido (Como todo garoto birrento jamais ia dizer não), e lá se passou aquele filme em italiano com as legendas em português.
Foi um dia que ficou muito marcado na minha vida, pois ali naquela situação eu estava assistindo um filme que pra sempre lembraria dele como “um dos meus filmes favoritos”.




Dirigido e produzido por Roberto Benigne, o filme narra a história de Guido (Benigne), o típico imigrante que vem do campo e vê o primeiro amor de sua vida, no caso a Dora (Nicoletta Braschi, mulher de Benigne na vida real), com cenas cômicas ele faz de tudo pra atrair a atenção de Dora.
Apesar do horror que estava a vir durante o filme, ele têm em sua primeira hora um andamento extremamento leve que lembra aqueles filmes noir da década de 40 misturados com aquelas comédias campais dos anos 70/80. Tudo ocorre bem, Dora é atraída por Guido, eles se casam e tem um filho “Giousuè” (Giorgio Cantarini)...Enquanto tudo isso acontece somos presenciados por cenas cômicas e um roteiro quase que poético...O Diretor usa o artifício do surrealismo em algumas cenas. Essa parte do filme poderia inclusive ser tema de outro filme, pois é completamente diferente da segunda parte da película...O aprofundamento dos personagens é o ponto central, pois mostra detalhes de tudo: Gostos, preferências, aonde eles vivem, seus passados....É o momento do filme em que conhecemos os personagens, e ficamos envolvidos com o seu caráter.
Guido é judeu....Também será a característica para o sofrimento que está por vir. Essa parte do filme se passa em 1939, quase na época em que Hitler explode a perseguição aos judeus.


Bom...a segunda parte do filme se passa em 1945, inicia com o chamado de recrutamento de Guido e seu filho (Giusuè tem aqui 5 anos) para o campo de concentração, Dora (apesar de não ser judia), se passa por uma e pede para ser lavada ao campo de extermínio, querendo assim acompanhar seu marido, mostrando a forma e a intensidade do amor de uma mulher com o homem.
Guido faz de tudo para esconder seu filho do sofrimento e horror em que estão vivenciando, para isso ele encena uma espécie de fantasia, uma ilusão...Faz com que o filho veja a realidade de uma forma diferente, a fantasia consiste em que eles estão numa gincana...e que cada judeu ali era um participante e tinha uma função.
Por exemplo, a função de Giusuè era se esconder para jamais ser encontrado (Claro, pois havia o alojamento das crianças e Giusuè tinha ficado escondidamente com o pai, e em determinado momento do filme todas as crianças foram exterminadas) fazendo com que o filho fique todo o momento do filme se escondendo, ficando em silêncio e não reclamando de nada.
Para a explicação da magreza das pessoas do alojamento, Guido diz que a função deles era a greve de fome...E assim por diante, quem desempenhasse melhor suas funções ia adquirindo pontos para sua equipe.
Guisué vai passando o filme sem não perceber o horror que o cerca, quando algum ponto mal explicado acontece, Guido inventa outra desculpa sempre fazendo alusão para essa fantasia.
Giusué começa a reclamar de fome, e Guido vai dando migalhas de pão ao filho, alimento que era a única coisa que ele encontrava...Uma das coisas mais marcantes e tristes do filme.
O Trabalho de arte aqui nessa parte do filme se destaca, as cenas são mais cinzas e os sons tensos...A intensidade das situações dramáticas fazem com que seja mais um drama pavoroso, do que um horror caótico.

Outra cena que destaco é a morte de Guido: Ele esconde seu filho numa lata de lixão, e ao ser descoberto por um soldado alemão é seguido por um beco, seu filho vê a cena e Guido vendo que seu filho via que algo estava errado ele olha para o lixo e começa a marchar de forma cômica, seu filho ri e não desconfia de nada...Ele é guiado para um campo fora da visão de Giosuè e é morto.


Comparação com Central do Brasil:
Impossível não comprar ambos os filmes. Na época “Central do Brasil” foi derrotado por “A Vida é bela” na categoria de melhor filme estrangeiro, fato esse que causou um certo mal estar entre os brasileiros.
Outro detalhe é que ambos os filmes tem focos num menino, e ambos os personagens tem nomes semelhantes: O Brasileiro chama-se Josué, e o outro Giosuè. Outra coincidência é ambas as personagens se chamarem Dora.
A Vida é bela está muito a frente, claro (Sem tirar o mérito de Central do Brasil, pois a atuação de Fernanda Montenegro está impecável).


Bom..Um filme italiano que mistura humor debochado com drama caótico, artes adversas que se encaixam de forma brilhante aqui, é de longe um dos filmes mais tristes de todos os tempos. Recomendo, provavelmente será um dos filmes mais lindos que você vai assistir. Não exige muito talento do expectador e ao mesmo tempo lida com um tema complexo que foi a segunda guerra mundial. Roberto Benigne já deixou sua marca aqui.

Nota: 9.6